segunda-feira, 28 de maio de 2012

Vigilantes desviados de funções

Os profissionais que deveriam cuidar da segurança patrimonial acabam fazendo atendimento direto ao usuário

É recorrente entrar em órgãos públicos no Distrito Federal e ser recepcionado por um vigilante que dá as coordenadas para onde se deseja chegar ou sobre o serviço pretendido, bem como organiza filas, entrega senhas, atende ao telefone e faz cadastro de visitantes. Nos hospitais, o senso de humanidade fala mais alto e eles (os vigilantes) também correm para ajudar os doentes e acidentados que chegam. Na falta de recepcionistas, eles fazem o trabalho burocrático e, em alguns órgãos, podem ser vistos atrás de computadores em guichês instalados na entrada dos edifícios.

O presidente do Sindicato das Empresas de Segurança Privada, Sistemas de Segurança Eletrônica, Cursos de Formação e Transporte de Valores no DF (Sindesp-DF), Irenaldo Pereira Lima, confirma que muitos vigilantes acabam desempenhando outras funções além daquelas para as quais foram contratados. “Quando a gente ganha a licitação do órgão é para fazer a segurança patrimonial. Só que quando se chega hoje em hospitais, postos de saúde, departamentos de trânsito e nos ministérios, o que se vê é o vigilante atrás de um balcão passando informações. Acho que isso não é fazer segurança”, argumenta. Ele acredita que o desvio de função decorre tanto da falta de pessoal para o atendimento ao usuário como pela falta de um plano de segurança.

Irenaldo destaca a preocupação com a condição do vigilante, pois muitas vezes eles podem estar deixando de lado suas atribuições principais e isso pode trazer consequências. “O vigilante, em vez de fazer a segurança do patrimônio do local, está ali distribuindo uma senha, passando uma informação. Em hospital eles distribuem senha e quando chega uma ambulância e não tem o maqueiro, aí eles ajudam a fazer o socorro de quem chegou. Se ele não fizer, não ajudar o doente, ele pode responder por omissão de socorro. É tanta coisa que está errada que a gente não sabe mais o que fazer”, observa.

Entre as preocupações com o desvio de função do vigilante está o porte de arma. Quando um vigilante armado está num hospital e vai ajudar a retirar uma maca da ambulância, ele pode ficar vulnerável e ver tomada sua arma, o que pode oferecer grande perigo para as pessoas no local.
“E se acontecer algum sinistro ali enquanto o vigilante está com a maca na mão? E se enquanto ele está ajudando o doente alguém chega e toma aquela arma dele? São situações preocupantes”, atenta.

Para o presidente do Sindesp-DF, antes de fazer uma licitação, os órgãos públicos deveriam exigir a elaboração de um plano de segurança para, a partir daí, ter a real estimativa do quantitativo necessário e também da forma do serviço de segurança a ser prestado conforme a necessidade específica do órgão. “A gente tem feito essa denúncia para o sindicato laboral, que é o sindicato da categoria. É preciso deixar o vigilante fazer o seu serviço mesmo. São coisas que até as pessoas que fazem a contratação têm que compreender que os vigilantes estão ali para fazer a segurança patrimonial e não esse desvio de função que existe”, aponta.

Plano de segurança

O dirigente sindical afirma que vem solicitando aos sindicatos, aos gestores de contrato e até da federação que reúne os sindicatos de segurança no país, para que seja elaborado um documento direcionado aos órgãos públicos alertando para a necessidade de que todos façam um plano de segurança. “Se eu faço um plano de segurança e o órgão aceita aquele plano, então se assume a obrigação de cumpri-lo e isso evita desvio de funções”, analisa.

Hoje, nos editais de licitação dos serviços de segurança patrimonial é requerido das empresas interessadas em participar que façam uma vistoria no local de prestação do serviço a fim de conhecerem a dificuldade do local e aceitá-la, quando na verdade deveria ser cobrada a elaboração do plano de segurança.

A falta do plano de segurança e os recorrentes desvios de funções colocam as empresas de segurança em situação de risco nos contratos com órgãos públicos, visto que em caso de sinistro, que seriam as ocorrências relativas à segurança, as empresas estão arcando com as responsabilidades sozinhas.

A falta da participação de um gestor de segurança na elaboração dos editais e no levantamento das necessidades é outro problema sério enfrentado pelas empresas. “Hoje os órgãos lançam edital estabelecendo quantitativos que a gente não sabe de onde veio. Simplesmente eles soltam um edital e a gente participa”, conta.

Segundo o dirigente da Sindesp-DF, Brasília possui 68 empresas de segurança pública e privada sendo que, dessas, 32 são filiadas a esse sindicato.

Vigilantes x recepcionistas

No Sindicato dos Vigilantes do DF, o presidente Jervalino Rodrigues Bispo contesta o desvio de função e, pelo contrário, afirma que muitos recepcionistas hoje vêm assumindo funções que seriam de exercício dos vigilantes. “Vários órgãos estão fazendo o seguinte: tirando os vigilantes, que são qualificados para fazer segurança no local, e colocando recepcionistas, onde a função do recepcionista é a mesma do vigilante e a recepcionista não está qualificada para fazer aquele trabalho. A gente vem brigando e está com essa demanda”, observa o dirigente.

Sobre as denúncias de desvio de funções, Jervalino considera muito difícil isso acontecer tendo em vista que a orientação do sindicato é de que os vigilantes não têm nenhuma obrigação de fazer outra função no local além da sua, e são, inclusive, proibidos disso. No entanto, o sindicalista afirma que as funções do vigilante depende do local em que ele está alocado. “Se for um serviço de portaria de verificar a entrada e saída, isso está correto. Agora se for num local de fazer segurança, ele não pode fazer outra coisa. Tem local em que o vigilante fica ali para manter a ordem de entrada e saída, e ele tem que identificar a pessoa e para ele identificar ele precisa saber quem entrou e que horas entrou”.

Nos hospitais, Jervalino admite que é mais difícil conter a possibilidade de um vigilante desviar de função. “Ali acontece sempre porque às vezes o doente chega e não tem ninguém para receber e o vigilante está ali solidário com aquela pessoa e acaba prestando alguma assistência para não deixar aquela pessoa morrer ali fora”, explica. Apesar de o sindicato compreender a posição do vigilante e buscar meio de protegê-los nesses casos, a orientação dada é de que os vigilantes não façam isso. “A gente sempre diz: evite sair do seu posto. Mas você sabe como é ser humano, procura sempre uma forma de aliviar o sofrimento do outro. Mas a gente orienta para ter cuidado nessa hora de trabalho”, destaca.

O presidente do Sindesv-DF concorda que é necessário que a empresa contratada tenha um plano de segurança para o órgão, assim saberá com maior efetividade quantas pessoas são suficientes para fazer a segurança naquele local e quais as necessidades da segurança ali. “Contratar o vigilante para um local onde a pessoa que está contratando não sabe nem para que e nem porque, é em vão o serviço e acontece demais. Às vezes tem um local perigoso que tem que colocar cinco ou seis vigilantes, mas eles contratam somente um”, argumenta.

O deputado distrital Chico Vigilante (PT) acredita que não há desvio de funções dos vigilantes nos órgãos públicos. Para ele, o que acontece é uma colaboração no atendimento aos usuários. Para o parlamentar, é perfeitamente natural ao vigilante ter que proceder cadastro de entrada e saída de pessoas, pois isso faz parte da função do vigilante que consiste, entre outras coisas, de observar, saber quem vai entrar e quem sai.

Por: LEA QUEIROZ
Fonte: Jornal da Comunidade

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